sexta-feira, 28 de maio de 2010

Segundas

Marquês de São Vicente;
Quatro, três, dois:


Padre Leonel Franca, Visconde de Albuquerque, Ataulfo de Paiva e Visconde de Pirajá;

Gomes Carneiro, Francisco Sá, Nossa Senhora de Copacabana e Princesa Isabel;

Lauro Sodré, Venceslau Brás, Pasteur e Pedro Álvares Cabral:

Praia de Botafogo;

Santiago Dantas, Pinheiro Machado, Ipiranga e Laranjeiras;

Santa Bárbara, Catumbi, Salvador de Sá e Estácio de Sá:

João Paulo I, Doutor Satamini, Professor Gabizo e Mata Machado:

Maracanã;

Varnhagem: Felipe Camarão e Boulevard;

Barão de Drummond, Visconde de Santa Isabel e Mendes Tavares:


Barão de São Francisco: Trabalhador

Renascença

Samba

Clube

terça-feira, 4 de maio de 2010

Repetidas

As pernas cruzadas, sentado no chão. Coluna em curva acentuada, tapete forrado de papéis autocolantes, um carpete de escudos e uniformes. Movimento contínuo de olhos, mãos e caneta. Acerta-se a postura, estica-se uma, depois a outra perna: todas dormentes. Pequenos pacotes vermelhos que trazem perfis, que trazem nações: que trazem homens. Figurinhas são espelhos de espelhos, ali me vejo porque também me enxergo: figurinhas são poços sem fundo, de desejos. Ir à banca com moedas e voltar com sorrisos.




Tenho, tenho, tenho: não tenho. Mergulhei na infância simplesmente ao atravessar a rua e nadar até a banca, um pedaço de metal cercado de calçada por todos os lados. Outros metais redondos, sacados do bolso da bermuda, me fizeram embarcar num passado distante e recente. Colecionar recordações, álbum de infância, mas não de família. Entregar as moedas na mão do jornaleiro, esperar, ansioso, a troca patrocinada: pacotinhos brilhantes, estalando de novos, grudados uns nos outros. Um maço de jogadores e pátrias. Um caderno de nações e times, um livro ilustrado de títulos e eu me procurando na memória. Onde estava há quatro, oito, doze anos?




Abrir os pequenos envelopes vermelhos, como se fossem correspondências dos próprios jogadores. Rasgos no topo papel. Rostos desconhecidos e familiares, cores diferentes – de jogadores e bandeiras – e palcos de grama. Separo, portanto, todas as figurinhas pela ordem das centenas. Pernas cruzadas, coluna torta, pescoço duro: figurinhas repetidas.




Casa dos cem, duzentos, trezentos, quatrocentos. Casa dos seiscentos. Não agüento mais tirar o mexicano. Guardado? Quando chegar junho não vou suportar ouvir o nome deste jogador, certamente estará guardado na lembrança da troca, porque já consegui quem faltava oferecendo sua cara marcada por outra que sequer tivesse visto. Separadas as figurinhas das centenas, como se escolhesse feijões, agora a organização é por times, por seleções. E por emblemas.




Lembrei do filho de uma querida amiga, que, ora vejam, colou todos os jogadores argentinos de cabeça para baixo. Preocupada com a distração da criança, a mãe alertou: “filho, presta atenção! Você colou as figurinhas da seleção argentina todas erradas! Estão trocadas. E agora?” O filho, do alto de seus seis anos, explicou: “Não, mamãe. Colei certo. Fiz assim pra dá azar pra eles!” A gargalhada foi geral. Ponto pro Brasil.




Seleções definidas, hora de colar as figurinhas. Lembro de outra coisa: são autocolantes. Eu, que sempre não levei jeito para colagens e afins, obviamente confundi jogadores, troquei nomes, inverti placares. Mas nada perto de outros tempos, quando era necessário um tubo de cola Polar - ou Pritt – para grudar os rostos no álbum. Fazia uma lambança geral, exagerava na cola, molhava toda a página e o verso, atrapalhando a colagem de outra figurinha de outra seleção. Corria para o recreio, há vinte anos, e com o papel de caderno e uma caneta em punho, catava bolinhos de gente com bolinhos de repetidas. Tenho, tenho: não tenho! E que raiva daqueles que – sempre houve – acabavam rapidamente e completavam o caderno de jogadores antes de todos e batiam no peito pelo feito. Esses ainda existem.




Colecionar figurinhas me permitiu uma viagem no tempo. Para quem pensa que é besteira, coisa de criança: ainda bem! Para quem está revivendo o passado, para quem vai à praça no centro da cidade para, especificamente, trocar figurinhas: que bom! E para quem não faz uma coisa nem outra: que pena.




E me recordo quando ganhava figurinhas jogando bafo. Lamber a palma da mão ou colar chiclete, não importava, o negócio era conseguir quem não tinha, o lance era conquistar um pequeno campeonato em virtude de outro, muito maior. A copa do mundo das crianças nunca termina. O homem maduro é um álbum de lembranças, vitórias e derrotas.




Figurinhas repetidas.