tag:blogger.com,1999:blog-26773843915531775472023-11-15T10:29:36.882-08:00Faca AmoladaContos, opiniões e poesia. Aqui se escreve com lâmina afiada e não há cortes. Desfiramos golpes certeiros!Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.comBlogger74125tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-22181187370260800892013-02-06T17:27:00.004-08:002013-02-07T03:43:57.223-08:00Tambores<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">O terreno não era muito grande. Cercas de arame farpado
guardavam afeto. Os ventos do lado de fora brigavam entre si um por um pedaço de céu. E
a luz vermelha acendeu-se do lado de dentro da caixa. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span>
<span style="font-family: inherit;">Diante da inevitável queda, teve as pernas feridas ao tocar o chão. Havia, no entanto, certo conforto em ferir-se daquela maneira. O coração pode oferecer surpresas. Mergulhar nesta casa-de-máquinas e suas engrenagens lhe custaria ferimentos em troca de respostas,
acreditava.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">Fazia tempo que não voltava àquele lugar. Examinou as
paredes cuidadosamente, como requer a minúcia da memória. Janelas abertas para
respirar. As portas de correr estavam imóveis, assim como as pessoas da sala. O
silêncio vagava entre as mesas e a melodia aos ouvidos era a mesma da primeira
vez que estivera ali. Havia mergulhado em seu próprio coração. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">A escuridão não foi problema. Lâmpadas queimadas ainda
presas aos lustres; armários despedaçados, cortinas mofadas e vidraças
empoeiradas. Nem mesmo o cheiro das flores era respeitado pelo passado. Mas
havia flores.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">Parecia, de certa maneira, que era a primeira vez que pisava
naquele chão sujo. Eram lembranças, eram fantasmas, ele não conseguia discernir
muito bem, mas havia poças de tempo espalhadas por todo o lugar. Que os
pássaros voem para a direção certa, pensava, mesmo que seus cantos sejam
precipitados. Agora que podia respirar novamente, lembrou de Teseu e sua sina.
Talvez o mais difícil não fosse enfrentar o que viria depois do labirinto, que
teve sempre aberta a porta. Sair dele era o mais difícil. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">Os morcegos deram lugar aos pintassilgos, uirapurus e
curiós. As corujas ficaram à espreita. Mas a cozinha é a mesma, só que mais clara. Paredes com outra mão de
tinta e o rádio voltou a funcionar. O chão agora tem cheiro de sorrisos e os
ventos trouxeram e fizeram as pazes. E passou-se a ouvir, ao longe, uma saudação.
Lenta e marcada. Tum. Tum. Estampidos graves de um, dois surdos. Tum. Tum. Um movimento binário. Marcação e resposta. Pergunta e resposta, como numa bateria de escola
de samba. E entre uma batida e outra,
nesse pequeno intervalo entre elas, desenha-se o silêncio, o surdo de terceira
como dizem os sambistas, como me ensinou o mestre Simas: o mistério do samba é
o silêncio - e o que você faz do silêncio. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">Foi quando voltou à superfície de si
mesmo. Não era sonho. Seu coração voltou a marcar e a responder. Marcar e
responder. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">E a sorrir outra vez. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-58967344983238988022012-12-24T01:18:00.001-08:002012-12-24T01:20:57.902-08:00Ciranda<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">A
minha casa tem poucos quadros. Muitas contas espalhadas pela mesa. Agendas
intactas. O apontador de lápis foi comprado em Uruguaiana. A garrafa de Gatorade
eu acabei de beber depois do futebol. Assisti a Contos de Nova Iorque com
minha mãe, semana passada, na casa dela. Na volta, assisti a outro episódio de House. Também
revi Baixio das Bestas. Pensei nuns três títulos para próximos livros (próximos
ou distantes) e tive uma leve constatação de que tenho lido pouco. Foi quando
lembrei de levar o carro amanhã ao mecânico, fazer outra tatuagem e dar uma
corrida pela manhã.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">Eu
penso em você quando acordo. Corro pra prateleira e abro meu livro favorito na
esperança que a página aberta seja a dos seus versos. Eu penso em você quando
abro a geladeira e procuro todas as frutas que você gosta. Abacaxi, banana e
laranja. Mesmo quando alguma está em falta, sei que você está ali. Porque
pensar em você é ter você comigo. Palavra é paladar. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">Ainda de manhã.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><span style="line-height: 115%;">A música do despertador é “Liberdade”, do
Marcelo Camelo.</span><span style="line-height: 115%;"> </span><span style="line-height: 115%;">Engraçado, mas pensei
que seria bom acordar ouvindo versos como </span><i style="line-height: 115%;">eu
vivo a vida na ilusão entre o chão e os ares.</i><span style="line-height: 115%;"> Talvez quisesse que fosse
esse meu mantra matutino, ainda que moribundo de sono. Os tempos são outros, de
fato. </span><span style="line-height: 115%;"> </span><span style="line-height: 115%;">Não sei mais se o sapato me cabe o
pé.</span><span style="line-height: 115%;"> </span><span style="line-height: 115%;">Escrever é ser livre. Mas a imprensa
ainda não entendeu que hoje qualquer furo já nasce ex-furo. A internet assaltou
as bancas de jornal e publicar no papel virou envelhecer a notícia.</span>Tenho
memória boa para datas. Não lembro de tudo, mas certas coisas ficam na cabeça,
no coração. Ficam na lembrança, não importa a gaveta. Esse ano foi complicado,
mas de muito aprendizado. Estudar cinema, mudar o leme da vida, escrever e
produzir um filme. A necessidade da mudança e a mudança por necessidade. Viver
é dançar ciranda em volta do mundo - uma translação em nós mesmos. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
</div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">É como
diz a Anne Huet: “quando se escreve um
roteiro, é importante estar disposto a se transformar em Cristóvão Colombo, que
partiu para descobrir as Índias e encontrou as Américas”. Acredito que não só na escrita, mas o
raciocínio se estende a toda e qualquer manifestação artística. Fazer arte é
não saber, mas sabendo. É descobrir-se e ser descoberto e ainda sentir-se inseguro.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
</div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">Gosto
de balões. Gosto da ideia de passear num balão. Soltar balões, não. Mas
embarcar nessa decolagem e me desfazer do peso
morto. Atirar pelos ares toda e qualquer coisa que não me sirva nos
céus. Às vezes, dependendo de onde você estiver, esse peso morto é um baú com moedas de ouro; também
pode haver mudança de vento. Mas o que importa mesmo é voar com pés no chão. Nunca fui à Capadócia, mas há tantos
balões pelo mundo! E quantos mundos...Daqui
de cima sou um pedacinho que continua em movimento, o pedacinho que abre novas
linhas, que percorre outros caminhos, meu próprio caminho. O pedacinho voltado
para o futuro e à vida, passando pelo caos. Por que somos saudade? O ser humano
é uma relíquia afetiva.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">O ser humano também é estômago e sexo, como diz o mestre Hilton Lacerda, ou ainda um caleidoscópio de espelhamentos
múltiplos, de acordo com Margarida Colares, me arrisco a dizer que ao me
definir, me perco pela definição. Sou mais caótico e me procurar já é um
abandono. Eu também sou uma banda de rock. Sou o intervalo entre contestar o sistema e falar de amor. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">O resto é amolar a faca no punho. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
</div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<br />
<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br />
<span style="font-family: Trebuchet MS, sans-serif;"><o:p></o:p></span></div>
Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-71166257648760799472012-08-20T21:13:00.002-07:002012-08-20T22:36:33.576-07:00Para a Julieta<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><i>“Oi
Quintella, tudo bom?<o:p></o:p></i></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><i>Cara, eu
tava pensando em várias coisas, comecei a escrever... O ano tá acabando, daqui
a pouco tá todo mundo na faculdade tomando seus rumos, seguindo novos caminhos.
Quando a gente é criança, sempre acha que os amigos vão ser amigos pra sempre.
E a verdade é que muitas dessas pessoas vão ficando pra trás, pelo simples fato
de que nada do que acontece na vida é à toa, que não existem meras
coincidências. E acho que isso vale também para as pessoas que passam por
nossas vidas. Acho que cada um que a gente conhece tem alguma lição para nos
ensinar. Lição que às vezes a gente aprende muito tarde. O importante, porém, é
não perdê-la pra não cometer depois os mesmos erros. A gente tá concluindo uma
etapa da vida, e agora que eu páro pra pensar, vejo que esse ano foi irado no
sentido de que eu conheci muita gente, muita gente diferente. E tenho certeza
que quanto mais pessoas você conhece, mais você aprende a conviver com elas, e
mais você aprende a lidar com as diferenças, com os defeitos e as qualidades. É
ótimo saber que podemos nos adequar às pessoas, porque mudá-las eu sei que não
vamos.”<o:p></o:p></i></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="font-family: inherit; line-height: 115%;"><span style="color: #444444;">(29.10.2000)</span></i></div>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><span style="font-family: inherit; line-height: 115%;"><br /></span>
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;"></span>
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">Todos meus
aniversários. Cartões deixados na portaria. Minhas histórias dos outros,
cemitério de pianos, diário da queda, a vendedora de fósforos, o sentido de um
fim, renato russo de A a Z. O seu abraço. A sua pele lisa e clara. O piercing
na sobrancelha... Direita? Seu sorriso medido e descompassado. Os olhos
curiosos e castanhos. Cabelos curtos, óculos. Alguns óculos. Sua insistência em
fabricar sósias.</span></span><br />
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Um jantar no
Miam Miam, um pedaço de bolo na Argumento, caipivodka no Dom João, festa na
Mineira Maneira. Sua dança. Uma tarde na
piscina, uma peça de teatro na escola. Sua maneira de escrever. Você me ensinou
a gostar do que eu escrevo. Quando me chama de darling, de babe, tomando café
da manhã comigo no Talho. Seu cafuné. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><br /></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">“My darling,<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Coloquei um Caetano, apesar da sua
implicância!<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Escute o disco e me diga do que
gostou. <o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Mil beijos,<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Julia”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Não lembro
bem quando a gente começou a se falar, mas o olhar reciprocamente curioso ou
curiosamente recíproco nos encurtou a distância. Era seu primeiro dia de aula
naquela escola onde eu havia ingressado meses antes. Também não sei dizer como
ficamos amigos. Lembro que trocávamos poesias durante a aula, especialmente nas
de Física e Química. Tínhamos dezessete, dezoito anos. Ela gostava da maneira que eu escrevia. E ela já escrevia bem
pacas. Então, não foi difícil descobrirmos afinidades literárias. E assim, de repente, nos encontramos. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Teve um dia
que cheguei virado na escola. Tinha passado a noite ao lado de companhias
lisérgicas e anfetamínicas, mas precisava ir à aula. Morto, destruído, moribundo,
a duras penas me dirigi à sala. Ela me viu. Ela me viu e soube na hora. Me
puxou pela mão. Ela me viu, me puxou pela mão e depois me viu, continuou a me
puxar pela mão e me fez sentar na carteira atrás dela. As vozes dos outros
alunos me cortavam os tímpanos, tudo que eu queria era sumir dali, mas
deitei cabeça sobre meu braço esquerdo
dobrado que fiz de travesseiro. Meu outro braço se esticou como que num
movimento sincronizado. E pedi sem falar que ela me fizesse carinho com as
unhas do pulso ao antebraço. Devagarinho. E tinha que ser dela. Tinha que ser
ela. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Também teve
churrasco da turma em Niterói. Não sei se foi Itacoatiara ou outra praia. Sei
que chegamos lá e <i>voilá</i> não tinha
nada programado pra nós. Fomos garfados pela empresa que organizou nossa festa
de formatura – e o “churrasco”. Mas foi um dia legal, fez sol e tudo. Fiquei
doidaço, bebemos, fumamos, tocamos o terror no ônibus na ida. E na volta eu me agarrei à ela. Pedi um
abraço e um cafuné. Voltei agraciado pelos mimos dela, carinho no couro
cabeludo, colo e cheiro de quem a gente gosta. Babei no casaco dela, disso eu
lembro. Fingi que nada aconteceu e só fui acordar – ou acordado – no Rio. Minha
vida foi mudando e ela ia comigo. Almoçávamos no Joe & Leo’s quando fui
estoquista e vendedor em shopping. Um dia ela me levou fotos de Oxford e me
contou sobre a viagem. Depois me disse que foi roubada, parece, e perderam-se
as fotos. Foi mais ou menos na época que passei a encontrar mais com ela.
Depois, nos afastamos. Culpa minha, sempre fui meio relapso nas amizades.
Talvez um pouco egoísta. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: #444444; font-family: inherit;"><i><span style="line-height: 115%;"> </span></i><i><span style="line-height: 115%;">“Quintella,</span></i></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">É muito mais irritante do que
maravilhoso ser sua amiga, mas antes de qualquer coisa é uma escolha... E sem
dúvida eu te escolheria de novo (o que não impede de você colaborar um pouco,
ok?!<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Beijos e abraços e carinho,<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Jú”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Sei que não
sou um grande sujeito, talvez um cara bacana e tal, mas no meio desse furacão
todo que tem sido minha vida percebo que você sempre me acompanhou. Esteve ao
meu lado mesmo longe – nunca distante. Nossas viagens a Penedo – a que fomos as
que não fomos-, o cheiro de novo do seu primeiro carro. Acho que era um Palio
branco. Ou preto? Cores parecidíssimas. Quando você saía da Barra pra me buscar na Gávea e depois voltava pra Barra</span></span><span style="color: #444444; font-family: inherit; line-height: 115%;"> e aí, sim, finalmente, rumávamos à Joatinga. Depois de buscar a Clarinha, claro. Nossas idas à
Reserva e Prainha. Lanches no Mc´Donald´s. Nossos papos, minhas imitações,
nossas gargalhadas, suas histórias. Quando eu perguntava se estava tudo bem com
você (e você percebia que eu me preocupava com você), porque seu jeito meio
quieto, meio fechado e que não demonstrava muito as coisas. Legião Urbana e Los
Hermanos. Carne de Segunda! Isso tudo fica guardado em mim e sempre me descubro
quando te procuro aqui. É dessa saudade
que eu falo. Eterna.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">E quando
tomei aquele porre federal na nossa formatura, antes de desmaiar, perder paletó
e o cacete a quatro? Você pegou o táxi comigo e me deixou em casa. Ficou ao meu
lado.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;"><br /></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">“Outubro/2000<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">P.S. Boa sorte em tudo, e mesmo que a
gente não seja amigos até morrer (tá certa essa frase?), eu sempre vou lembrar
de você com muito carinho!<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">P.S de novo: Eu escrevi essas paradas
de madrugada, com insônia, achei que você fosse gostar, então acrescentei uma
parte (a que eu fiquei puxando seu saco – BRINCADEIRINHA!!!) e resolvi te
entregar. <o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">P.S. Desculpe os erros de português”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 115%;"><span style="color: #444444; font-family: inherit;">Julia, eu te
amo muito. Sumi da sua vida, reapareci. Tornei a sumir e a voltar. De repente
eu precisava me encontrar, me assimilar. Nesses doze anos que nos conhecemos,
talvez tenham sido os mais doidos da minha vida. E você esteve comigo. Num email,
num telefonema, num gtalk, numa carta, num livro, num abraço, num cafuné, num
beijo, numa risada, numa praia, numa lembrança. Obrigado por não desistir de
mim – mesmo quando você desistiu e não me disse nada. Obrigado pela paciência,
pelo seu amor sereno e desmedido. Pelas caronas em dias de chuva. Pelo seu colo. </span></span><br />
<span style="color: #444444;"><i style="line-height: 12.75pt;"><span style="font-size: 9.0pt; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-bidi-theme-font: minor-latin; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><br /></span></i>
<span style="line-height: 12.75pt;"><span style="font-family: inherit;"><i>"My love,</i></span></span></span><br />
<div class="MsoNormal" style="background-position: initial initial; background-repeat: initial initial; line-height: 12.75pt; margin-bottom: 0cm;">
<i style="font-family: inherit; line-height: 12.75pt;"><span style="color: #444444;">a semana ta acabando e a gente nada de se encontrar.</span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="background-position: initial initial; background-repeat: initial initial; line-height: 12.75pt; margin-bottom: 0cm;">
<i style="font-family: inherit; line-height: 12.75pt;"><span style="color: #444444;">vou te falar logo a verdade: eu ODEIO esse mês de dezembro, e esse ano
todas as pessoas que moram fora resolveram vir pro Rio, marcaram mil coisas,
não sei mais que dia vou encontrar quem... isso me dá um mau humor que você não
imagina.</span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="background-position: initial initial; background-repeat: initial initial; line-height: 12.75pt; margin-bottom: 0cm;">
<i style="font-family: inherit; line-height: 12.75pt;"><span style="color: #444444;">você vai estar por aqui entre natal e ano novo? senão a gente
deixa pra janeiro, sem essa confusão de amigo oculto e coisas pentelhas...</span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="background-position: initial initial; background-repeat: initial initial; line-height: 12.75pt; margin-bottom: 0cm;">
<i style="font-family: inherit; line-height: 12.75pt;"><span style="color: #444444;">beijos com saudades,</span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="background-position: initial initial; background-repeat: initial initial; line-height: 12.75pt; margin-bottom: 0cm;">
<i style="font-family: inherit; line-height: 12.75pt;"><span style="color: #444444;">Ju"</span></i></div>
<span style="color: #444444;"><span style="line-height: 115%;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span>
<span style="line-height: 115%;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span>
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">Parabéns, minha querida. Obrigado pela sua
vida.</span><span style="line-height: 115%;"></span></span><br />
<span style="color: #444444; font-family: inherit; line-height: 115%;"></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-70680357483460296662012-08-12T07:55:00.000-07:002012-08-12T07:59:37.482-07:00Vovó Maria<br />
<div class="MsoNormal">
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="background-position: initial initial; background-repeat: initial initial; line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">"na hora de pôr a mesa, éramos cinco:<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">o meu pai, a
minha mãe, as minhas irmãs<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">e eu. depois,
a minha irmã mais velha<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">casou-se.
depois, a minha irmã mais nova<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">casou-se.
depois, o meu pai morreu. hoje,<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">na hora de pôr
a mesa, somos cinco,<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">menos a minha
irmã mais velha que está<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">na casa dela,
menos a minha irmã mais<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">nova que está
na casa dela, menos o meu<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">pai, menos a
minha mãe viúva. cada um<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">deles é um
lugar vazio nesta mesa onde<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">como sozinho.
mas irão estar sempre aqui.<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">na hora de pôr
a mesa, seremos sempre cinco.<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">enquanto um de
nós estiver vivo, seremos<o:p></o:p></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">sempre cinco."</i></span><span style="background-color: #ffffcc; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;"><br /></i></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="line-height: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt 35.4pt;">
<span style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i style="background-color: #fff2cc;">- José Luís Peixoto</i></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><span style="line-height: 115%;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">Maria do
Carmo, muito prazer. Com quase noventa anos, minha avó cumprimenta a todos
desconhecidos dessa maneira. Pode ser amigo meu ou o fulano da esquina. A
maneira frágil de se locomover e de se manifestar contrasta com a doçura e</span><span style="font-family: inherit; line-height: 115%;"> </span><span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">a maciez da voz – e das mãos – ao dar carinho
a algum neto, a um filho ou aos, agora, bisnetos. Do sotaque carregado gaúcho,
como sór quente e aróz. </span><span style="font-family: inherit; line-height: 115%;"> </span><span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">Mas sei que ao
me ver, ela vê meu pai. Ela vê em mim o filho que morreu. Ela vê em mim o filho
que não morreu. Ela me vê e me vê também. Ela não me vê e me vê também. Ela vê
meu pai vivo em mim. Ela nos vê e nós a vemos hoje. Porque é dia dos pais e
porque é o dia dela. Eu acho que os dias dos pais são da minha vó. E não se
trata de prestação de contas ou aceitação da realidade viva, da realidade
morta, da realidade moribunda. Para mim, os almoços de domingo serão sempre
dias dos pais. Meu avô Argemiro, minha avó Maria do Carmo, meu pai Arcanjo,
minha mãe Sandra, minha tia Cléa, minha tia Tania, meu tio Miro, meu tio Ailto,
minha prima Joana, minha prima Maria Julia e suas filhas, Leticia e Luiza, e
todos nós que cabemos naquele apartamento, que é do tamanho do coração da vovó.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><span style="line-height: 21px;">É dia dos pais e eu acabei de acordar. A casa mais vazia e o cachorro no pé da cama. </span><span style="line-height: 21px;"> </span><span style="line-height: 21px;">São onze da manhã e vou almoçar na minha avó. </span><span style="line-height: 21px;">O último dia dos pais que passei com o meu foi há mais de dez anos. Naquele domingo decidimos almoçar na Feira de São Cristóvão. Meu pai não era do tipo de almoçar em lugares caríssimos para justificar a data. Tampouco achava que o dia havia sido criado pelos porcos capitalistas de nossa burguesia estúpida. Meu pai não vinha com esse papo todo. Simplesmente olhava pra mim e arriscava: “Irmãozinho, esse negócio de almoço especial não tá com nada. O que eu queria mesmo era ir pra São Cristóvão, almoçar na feira, beber uma gelada contigo beliscando uma carne de sol, manteiga de garrafa... Como você tá nessa onda de forró, de repente era uma, não era, não?”</span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;">Como recusar, pai?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;">E fomos. Eu havia acabado de completar dezoito anos. Meu pai completaria cinquenta meses depois. Passeamos pelos corredores da feira, cheiro de cerveja no chão, bêbados derrotados pelos becos, forrós e xotes se confundindo pelos ares e ouvidos, e eu pela primeira vez andava ao lado de meu pai sem segurar sua mão. Nenhum de nós disse nada, mas ali percebi que me tornava um homem. Pois beberia a primeira cerveja com meu pai; pois ouviria pela primeira vez os problemas de meu pai; e pela primeira vez, com meus cabelos crespos, olhos curiosos e camisa do Bob Marley, olhei pra ele e disse: você é mais que meu pai, você é meu amigo.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;">Em seguida apareceu um cara com uma polaróide. Tiramos a foto instantânea. Não saímos tão bem: eu fiquei com cara de doidão e meu pai saiu meio gordo. Quer dizer, a foto reproduziu fielmente nossas imagens, mas torcemos o nariz para o resultado final. E penso, hoje, que a vida é assim mesmo.</span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 21px;"><span style="font-family: inherit;">Aliás, vó: feliz dia dos pais! Te amo e já estou indo filar a boia. </span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 14pt; line-height: 115%;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-50201030116432992362012-07-01T08:35:00.002-07:002012-07-01T08:41:54.262-07:00Vulto<br />
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
<span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Escrever é algo parecido com sentir. Ao mesmo tempo que dá medo,
também nos liberta. Acontece que, de tempos pra cá, tenho escrito pouco. Não
tenho tido inspiração, as palavras se tornaram mais distantes, mal consigo
rascunhar como fazia há alguns meses. De certa forma não é tão desesperador,
penso que o homem se humaniza na falha, mas me preocupa. <o:p></o:p></span></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
<span style="background-color: #fff2cc;"><br /></span></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
<span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Sempre imagino como seria o primeiro capítulo de
meu livro, caso quisesse, de fato, escrevê-lo. As primeiras linhas... É claro
que gostaria de saber como seria o livro todo, página a página, mas o capítulo
inicial é primordial. Também tenho curiosidade pela vida, mas talvez menos. Na
verdade me intriga o fato de ainda estar curioso – e não ansioso – para viver.
Ainda não escrevi nada.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
<span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Às vezes me sinto ignorante. Não critico minhas escolhas, tampouco
me arrependo delas, no entanto reflito constantemente sobre o que fiz a partir
do que escolhi. Sim, optei por um caminho e não pelo outro, que ótimo, como
tenho coragem e perseverança, mas e aí? Para se ter alguma coisa na vida é
preciso abrir mão de outra. Não basta decidir. O distanciamento entre o que penso
e o que sinto, meus bens mais preciosos, sempre é encerrado na medida do tempo
que leva para medi-lo. Levanto acampamento e sigo viagem. Não existe silêncio. </span></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;">
<span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Eu me burlo. Se penso, posso agir ou não. Valho-me dessa ponte levadiça. Mas, se
sinto, sinto. Não há escolha, porém decisões. </span></div>
<u1:p></u1:p>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-86062817002659299332012-06-04T19:01:00.000-07:002012-06-04T19:15:55.584-07:00Paralelos<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><i>-</i> Ou a gente vai
ser muito feliz ou a gente vai ser pouco feliz. Mas, infeliz, não!</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Por que você acha isso?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Porque o erro das pessoas é querer a máxima felicidade, a
suprema, absoluta. Ela não existe. Qual
a diferença entre ser muito feliz e pouco feliz? A felicidade tem medida? O
pouco feliz é mais feliz que o muito feliz. Acho que ser infeliz é querer a
perfeição. Isso não é querer sentir, é
pensar em sentir. Como se racionalizar fosse uma saída e não uma fuga. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- E você me acha racional?!</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Porra, muito. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;"> - Sério?! Lógico que
não! Eu sou a mais passional que tem.
Quando me entrego, mergulho de cabeça, não quero nem saber. Me envolvo, entende? Tenho meus rompantes,
explodo, me apaixono, brigo, choro. ..</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Só alguém racional se define tão bem...</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Caraca! Você me acha mesmo, né?!</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Acho, mas, porra, eu também sou. Aí, acho que é menos
preocupante. Quer dizer, só quem vive abraçado à razão usa a expressão “menos
preocupante” para definir uma característica comum. Não digo afinidade, mas o
defeito. Porque as pessoas acham que ser racional é ser frio e ser passional é
ser burro, né?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- É, acho que é isso mesmo! Aí, vem alguém dizer que tem que
ter um equilíbrio e tal, não pesar pra nenhum lado... Impossível! Querer
calcular essa medida! Quer alguma coisa mais racional que essa?!</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Então por que estamos aqui?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Ué, não sei... A
gente veio tomar um chope, conversar. Ou você diz no sentido, tipo, sei lá,
filosófico?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Não, digo no físico mesmo. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Bom, a gente se conheceu, foi tudo muito rápido. Mas tipo,
quando a gente fala assim “foi tudo muito rápido” parece que temos uma
história, um caso. E pô, você sabe, nunca rolou nada. Mas eu não sei, gosto de
estar com você. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Eu também gosto de você, sabe? Foi de repente. Se vê todo
dia, nesse horário. Mesma ponto, mesmo trajeto, mesmo destino...</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Mó viagem isso, né?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Acho isso foda... Essas coincidências, amigos em comum dos
mais estranhos lugares e épocas, aquela história do ônibus, você estudou onde
eu vou estudar... Sei lá, isso assusta, né? Não um susto de medo, mas de
alerta. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<o:p style="font-family: inherit;"><br /></o:p><br />
<span style="font-family: inherit;">- Alerta que pode não dar certo?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Não, alerta de que pode dar certo...</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Aí, você tá racionalizando de novo! Viu?! E depois diz que
não racionaliza. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Mas quem fiscaliza também é. </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Tá certo, é verdade. Mas eu não nego. Bom, você tem que
ir, né?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Ih, caramba, vou chegar MUITO atrasada! Viajei... e olha
lá, viu?! Acabou de passar o meu ônibus! </span><br />
<span style="font-family: inherit;">Tenho que correr pro ponto!</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Posso ir com você até lá. (eu deveria surpreendê-la)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span><br />
<span style="font-family: inherit;">- Tá bem... Mas ir até onde?!</span><br />
<br />
- Um lugar onde a pressa não tenha razão...</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-17932645841795408232012-05-01T18:51:00.000-07:002012-05-01T18:54:37.759-07:00Dialética<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">mãos</span><br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">sentidos<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">estilhaço<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">a mesma rua<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">nunca<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">é<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">a </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">mesma<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">rua<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit; line-height: 115%;">a<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;"><span style="line-height: 115%;">a</span><span style="line-height: 115%;">travessar</span></span></div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-52857738290460718132012-04-13T06:37:00.000-07:002012-05-01T18:56:26.081-07:00Percurso<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">gargalo</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">passagem </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">pela </span><br />
<span style="font-family: inherit;">superfície </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">sede</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">sem copo</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">endereço </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">sem número</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">da </span><br />
<span style="font-family: inherit;">palavra </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">seca </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">sem </span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: inherit;">leme</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-87739895945357101882012-03-28T14:50:00.009-07:002012-03-28T15:00:22.919-07:00Quinze anos<div class="ecxMsoNormal" style="background-color: white; color: #2a2a2a; font-size: 13px; line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"></div><div class="ecxMsoNormal" style="margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Rio, 13/05/1997</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Bruno,</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Acho que estamos sem nos falar (e de repente, com uma visão estranha um do outro), por muitos mal-entendimentos (por minha e por sua parte).</span><br />
<span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit; line-height: 17px;"><br />
</span><br />
<span style="background-color: #fff2cc;"><span style="font-family: inherit; line-height: 17px;">Tudo começou porque nós “acabamos” (o que na verdade por nossa parte nem começamos) numa boa. Eu realmente tinha achado que você tinha feito “coisas” ridículas comigo (que não vem ao caso). Desde então, o clima se modificou totalmente, mas ainda nos falávamos bem. Foi aí que me falaram que você disse umas coisas sobre mim aos meninos (fiquei muito chateada, mesmo sem saber o que você havia falado, mas sabia que era alguma coisa ruim e aí te achei mais ridículo ainda). Daí em diante, eu já não conseguia falar com você como antes, parecia que havia uma barreira. Então, nós fomos nos falando cada vez menos até parar, eu pensei que você não queria mais falar comigo e você achou que eu não queria mais falar com você, foi um mal entendido, mas já estava se acumulando com tudo. Agora, além de todos esses mal-entendidos, o pior de todos não ocorreu (ou pelo menos é o que eu acho) </span><u style="font-family: inherit; line-height: 17px;">eu</u><span style="font-family: inherit; line-height: 17px;"> não queimei </span><u style="font-family: inherit; line-height: 17px;">seu</u><span style="font-family: inherit; line-height: 17px;"> filme com ninguém (principalmente com gente da 7ª série, como eu poderia se eu nem conheço?), aliás pensei que </span><u style="font-family: inherit; line-height: 17px;">você</u><span style="font-family: inherit; line-height: 17px;"> estivesse queimando o </span><u style="font-family: inherit; line-height: 17px;">meu</u><span style="font-family: inherit; line-height: 17px;"> com</span><span style="font-family: inherit; line-height: 17px;"> seus amigos...</span></span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit; text-indent: 35.4pt;">Quero te explicar o que houve:</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">As únicas pessoas que eu falava que fiquei chateada com você eram Carol, Cacá, Ana Cristina, Bruna, Bianca, Andréa e Ana Luisa (que até algumas vezes me ajudaram a enxergar na época que eu estava chateada, antes de acabar). Eu falei para elas que eu fiquei chateada com você porque quando estávamos “ficando”, você falava mais com a Carol do que comigo (e isso você sabe que era verdade), aí chegava na hora da saída, fora do colégio, e você me beijava, e que fiquei muito confusa ( e até pensei que você tivesse vergonha de mim, apesar de não ter dito isto a ninguém, só a Carol).</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Agora vou te falar porque eu disse tudo isso a elas, afinal não foi por nada:</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Elas perguntaram por que nós não estávamos namorando (porque terminamos) e por que não nos falávamos mais (que nem eu sabia responder), daí eu falava aquilo. Cada vez me confundia mais. Por causa disso eu até fugia do assunto Bruno (foi mal) porque não queria ficar comentando com ninguém. Outra coisa, tudo que eu falava no meu grupo, elas concordavam ( e eu só falava quando alguém tocava no “assunto”) e até falaram coisas, que não partiam de mim, mas que em algumas vezes eu concordava, por exemplo, como perdeu o “encanto” (não por minha causa, aliás nada comigo). E também falam muito bem, como a Andrea que disse:</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;"> - “Ah,! Ele é super legal, você não acha?” </span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;"> Daí eu nem contestava e logo falava:</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;"> - “É até pode ser, mas comigo ele não fala mais, não posso dizer se sim ou não.”</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Quando eu estava com raiva, dizia que você era “chato” <u>comigo</u> (e deixava isso bem claro: <u>“comigo”)</u> mas alertava que era porque eu estava com um pouco de raiva. Ah! Lembrei de uma opinião geral que não partiu de mim, mas que por parte eu concordei, foi que você é um “grude”.</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">Agora pra falar verdade era impossível eu queimar seu filme com pessoas além dessas (que mesmo assim não acho que eu queimei, pelo contrário, pois eu não conheço “praticamente” ninguém do colégio, as minhas amigas então, muito menos. Era bem mais fácil você queimar o meu filme, você era mais “conhecido” na sala do que eu. A partir do momento que não nos falamos mais, meu filme já estava queimado. Em relação à 7ª série (que você conhece algumas garotas) era impossível te queimar, eu nem conheço ninguém de lá, era impossível eu falar com elas. No entanto, te peço 1000 desculpas se você ainda acha que <u>eu<i> </i></u>queimei seu filme com o pessoal, realmente não tive a menor intenção e eu acho que há pessoas que aumentam muito (tipo: escutam A, B, e te falam “A”, “B”, “C”, “D” e “E”). Agora se você não quiser minhas desculpas e não quiser acreditar em mim, aí eu não tenho mais o que fazer. Espero que tudo se esclareça e que voltemos a nos falar.</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc; font-family: inherit;">(Responda por favor)</span></div><div class="ecxMsoNormal" style="line-height: 17px; margin-bottom: 1.35em;"><span style="background-color: #fff2cc;"><span style="font-family: inherit;">OBS: Eu também falei pras meninas que uma vez quando nós falamos no telefone, você falou (ou melhor, perguntou) se rolaria alguma coisa, se você não tivesse sido ridículo, daí eu falei que não, porque não tinha nada a ver e que também nós éramos da mesma sala, ou também falei que isto era uma desculpa, porque eu não queria mais por causa daquilo e não conseguia me ver em outra situação, daí ela falou que se não rolou uma vez é difícil (ou não) rola outra vez. Eu também disse só a algumas meninas que uma coisa me irritava era que você sempre falava: falaram, alguém disse... (nunca dizia quem). E outra coisinha: não me elogiava, só </span><u style="font-family: inherit;">se</u><span style="font-family: inherit;"> elogiava (sem querer ofender), me irritava.</span></span></div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-3621313219638279742012-02-27T17:34:00.001-08:002012-02-27T17:42:56.961-08:00Carnaval<div class="MsoNormal">A manhã lilás e o ar parado. Janelas suadas. Ar condicionado. Tapete e almofada. Televisão sem volume. O som do jornal arremessado à porta. O teto reconhecido de baixo. O chão desconhecido no pé. A visita anunciada do sol: era sábado. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Os estalos das articulações. O espreguiçar curto da pressa. Fontes de energia. Bateria. Celular. Computador. Pão. Queijo. Presunto. Cheiro de café do vizinho. Água de coco e daquela que matou o guarda. Passarinho tá com sede: é sábado. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Óculos grandes, peruca, chinelos. Telefonema. Garrafas plásticas. Gelo. A manhã rosada e o ar lento. Janelas abertas. Música. Rádio: volume sem televisão. O jornal folheado às pressas. O teto testemunha de cima. O chão redesenhado à risca. A luz intermitente do sol: sou sábado. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">A chave de casa no bolso, o gole de gelo na boca, o soro pingado nos olhos: a vista recuperada do susto. A bolsa no colo, o porteiro com sono sorri, o portão da garagem sem medo: o retrovisor do carro sem nó. A manhã alaranjada e o ar desordenado. Janelas sem vidros, tanque sem gás: o jornal pelo rádio sem som. O teto pequeno. O chão imóvel. E o sol torto pelo espelho cego: sábado é o álibi do domingo.</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Posto vazio, ruas viradas, lagoa ensolarada. A vontade dela, a saudade daquela e a certeza: ela. Um refrão na voz do Roberto, o Ribeiro, frisa-se, para não haver desencontro. O toque do celular, o amigo atrasado, a amiga ansiosa, os amigos que não dormiram, os que não acordaram. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Abre a porta, já tem gente cantando. Amanhã tem mais. Para ontem não há palavras. Mais um hoje. Vamos de novo. O bloco saiu. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Mas já volta.</div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-11209765252168339622012-01-04T08:20:00.002-08:002012-01-04T08:27:44.549-08:00Abrir caminhos<div class="MsoNormal">Sentir saudade é indefinível. Pode-se, claro, recorrer à tentativa de explicá-la através de uma música daquela época, de um cheiro da infância, de um lugar, de um sabor. Dizem que ter saudade é bom; também sei dos que concordam que é ruim, pois certas vezes não poderemos, nunca, encontrar naquela pessoa ou naquilo que nos faz lembrar daquele tempo, a razão da falta. E aí dá um aperto no peito: a respiração vacila.</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Abrir espaço para o novo. A frase que ouço desde criança reaparece na memória logo no início do ano. Talvez porque minha mãe repita tais palavras naquela ordem nesse mesmo período. Sempre me perguntei a razão do conselho, se é que pode-se chamar assim, mesmo que saiba de minha dificuldade em desvencilhar-me do passado. Recortes de jornal, revistas antigas, contas já pagas, comprovantes bancários, fotografias de pessoas que não amo mais e, ainda, das que não me amaram nunca. Lá no fundo, apertando a ferida, insisto: ah, mas, de repente, posso precisar ler de novo aquele artigo, o banco pode dizer que não fiz o depósito, podem dizer que o pagamento já saiu. Aquela pessoa pode voltar, aquele tempo pode voltar e eu posso voltar a ser aquele que guardou a foto. E logo após o mergulho, ao recuperar o ar do tempo, reconheço que a lágrima é o único líquido retido pela lembrança. Amontoar recordações, quaisquer que sejam, impossibilita viver coisas novas – ou simplesmente viver.</div><div class="MsoNormal"></div><div class="MsoNormal"><br />
No entanto, buscar a saudade é estranho. Cercar-se de artifícios que nos remetam a outras épocas ou a outros eus, os que passaram, não nos ajuda a abrir o caminho para o novo. Quase forjamos uma nova personalidade a partir da antiga, não nos permitimos falhas; o receio de seguir em frente, mesmo quando seguir em frente não significa seguir em frente: às vezes caímos num precipício, outras tropeçamos – e só seria possível se déssemos o passo na direção da vida. Quem é esse novo? O amor, o trabalho, o sofrimento, a saudade.. Ainda não sei bem.<br />
<br />
Mas mudar sempre é novo.<br />
<br />
<br />
</div><span style="font-family: Calibri, sans-serif;"><span style="font-size: 15px; line-height: 17px;"><br />
</span></span><br />
<div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal"></div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-66887406230194250452011-12-19T18:00:00.002-08:002011-12-19T18:06:10.110-08:00Uma estrela amiga<div class="MsoNormal">Outro dia a Cris preparou um almoço delicioso na casa dela, coisa que volta e meia ela, zás, cisma de cozinhar. O menu era risoto de figo e peito de pato. Pode parecer metido à besta, mas quando ela cozinha, a certeza do bom gosto se sobrepõe à dúvida da oferta. Chamei a Luizinha e chegamos junto com o Ceguinho. Ziza apareceu logo depois e éramos cinco à mesa. Abrimos um vinho que levei de minha modesta adega que, apesar da tarde quente, caiu muito bem. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Uvas verdes, nutella e sorvete de creme para fechar bem o cardápio do dia. Depois fomos à sala e ficamos de conversa fiada, para jiboiar a comida. Aquela lombeira gostosa depois de uma bela refeição. Foi quando Cris me desafiou a tocar violão, quando falávamos do duvidoso talento de um amigo em manusear o instrumento. Saiu e voltou com a viola nos braços: toca aí, então, alguma coisa pra gente. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">O reencontro inesperado com minha adolescência me trouxe tanta coisa boa, como me levou de volta àqueles tempos maravilhosos. Toquei Legião Urbana, Cazuza, Marisa Monte... Tinha me esquecido de como é bom reunir amigos e cantar, viajar na sua onda, pensar na vida, tentar se procurar, mais uma vez, nas letras e na melodia. Lembrar porque tal música me faz – ou fazia – sentir aquilo que sentia; relembrar o que se pensava naquela época, em se gostava de certa pessoa. Havia mais de dez anos que não tocava violão. Já havia dedilhado uma viola na casa de algum amigo, mas tocar por boa parte de um sábado à tarde, cercado das minhas três melhores amigas, um camarada a quem tenho grande apreço, depois de um almoço saborosíssimo, me fez perceber que estou vivo. E mais do que isso: eu preciso estar vivo. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">E percebi que tudo isso só foi possível por causa da Cris. Quando nos conhecemos, em circunstâncias curiosas, ainda éramos estagiários em empresas diferentes; quando ainda não nos sabíamos felizes graças a quem nos cercava; quando cismávamos em socorrer quem não nos socorria; quando permiti que ela me puxasse a orelha, quando precisava ouvir o que só ela poderia me dizer, me alertar, me colocar no chão. Eu, que já considerei um erro sua mania de ser mãezona, que já lhe fiz as maiores grosserias; ela sempre esteve lá, ao meu lado ou me colocando debaixo da asa. A tarde que passamos na sua casa. Os amigos que fiz a partir da nossa amizade. Amigos que chegam depois e ficam pra sempre. O violão. A melodia. A dança. O bolo de aniversário que ela levou pra mim; o aniversário da Aline no Dendê; as compras da festa junina; o saquê que eu poderia pagar depois; o réveillon inacreditavelmente inédito; a Ziza; o ombro, o rosto, o sorriso; as lágrimas. O abraço. A amizade. O amor. E, como nos versos na música do Tim Maia, Cris, que leva seu nome: Meu caminho é ida sem volta/ Uma estrela amiga me g<span style="font-family: inherit;">ui<span style="line-height: 19px;">a/ Minha asa presa se solta. </span></span></div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Pensei: deve ser possível então ser feliz. E naquela tarde foi assim. É como no filme em que o personagem do George Clooney pergunta ao noivo da irmã: pense em todos os momentos felizes da sua vida. Em qual deles você estava sozinho?</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Obrigado, Cris. Você é foda.</div><div class="MsoNormal"><br />
</div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-13488854968137533562011-12-11T16:22:00.011-08:002011-12-14T06:25:21.485-08:00Fantasias<div>Nunca tinha ido àquele lugar, mas o aniversário de um amigo me fez debutar no referido inferninho do rock’ n’ roll. Fui sozinho, cheguei a beber em casa algumas doses de uísque, mas não fazia diferença mais o quanto beberia depois, porque quando conhecemos alguma coisa nova somos todos agraciados pelo sumiço do que fomos até ali. Como uma folha amarelada e seca ao desprender-se do galho, depois de uma varredura despretensiosa de uma brisa. </div><br />
Adentrei ao salão rumo à pista de dança. Estiquei o pescoço por cima da multidão espremida e embalada pelas músicas estrangeiras. Entre pedidos de licença e de desculpas, alcancei o grupo de amigos onde estava o aniversariante e pousei próximo à rodinha de amigos e conhecidos. Sacolejei um pouco o corpo e rapidamente, impulsionado pelos goles do escocês que havia no copo de vidro da mão, entrei no ritmo da bateria, contra-baixo e guitarra. Tudo bem até aí, novidades são sopros do acaso, quando ficamos à mercê das coincidências. E eis que uma amiga de ascendência oriental, queridíssima, repousa a mão sobre meu ombro e me apresenta uma amiga, supondo que, acredito, já nos conhecêssemos. Ao perceber a dupla negativa, não houve tempo para saia justa, ela e eu, num movimento involuntariamente fabricado, cumprimentamo-nos e tentamos nos (re)conhecer melhor, procurando encontrar outras pessoas em comum. Pois bem, achamos alguns tais, mas que não valem a pena divagar por estas linhas. Sigamos.<br />
<br />
Gostei do jeito dela dançar, sabia sacolejar bem, melhor do que eu, mas isso não chega a ser difícil, porém, de qualquer maneira, agradou-me. O jeito que jogava os braços para cima e para baixo, as pernas desordenadas rabiscando o chão escuro e quiçá invisível, rosto inclinado para baixo; cabelos, cortinas. E eu a-com-pa-nha-va seus movimentos sem ensaio, pelas curvas das músicas. Procurava seus olhos. E ela ali, firme, sabia que eu a fitava, e eu tinha consciência de que ela consentia meu descaramento velado. Eu ainda procurava disfarçar, à meia-boca, alternando pequenos goles de malte que já estava aguado pelo gelo precocemente liquefeito. Ela aproximou os lábios ao pé do meu ouvido, perguntando qualquer coisa. A música alta impossibilitava qualquer diálogo que a situação merecia, mas mesmo assim, embalamos num papo legal, que tinha Rock’n’Rio como assunto inicial, quando foi o primeiro, e o segundo?, você era nascida, eu também, mas, Bruno, você era muito novo, como lembra?, olha, eu consigo recordar alguma coisa, quantos anos nos separam? Ah, você não sabe, faça as contas; E eu fiz qualquer operação algébrica, que, evidentemente, estava errada – e ela me corrigiu, sorrindo. <br />
<br />
As bexigas apertaram e nos separamos por alguns minutos. Como as coincidências fabricadas, nos esbarramos, de novo, e subimos para o outro andar. Música lenta, ou melhor, menos agitada, pessoas esparramadas pelo sofá, pelos pufes, fantasias penduradas pelos cabideiros da sala. Chegamos a dançar alguma coisa, rostinhos colados, risos descolados, porque somos moderninhos, um esboço de beijo, uma recusa despretensiosa, uma provocação deliciosa. Dançamos mais um pouco. Atendendo aos apelos de uma moça, que deveria ser amiga dela, posamos para fotos engraçadas, dessas da moda, onde escolhemos fantasias e nos expomos ao deleite da ocasião. Bengalas, chapéus, perucas e outros apetrechos, não lembro se ela chegou a usar alguma echarpe, mas não importa, fotografaram nós dois. E mais outra foto. E a terceira, como se fôssemos quase amigos, um beijinho doce, uma bitoquinha, que deu apenas para sentir o gosto dos lábios dela nos meus, talvez por isso estalei os beiços depois de passar a língua sobre eles. Descemos de volta. Antes disso, porém, ficamos na fila (bexigas apertam sempre, é fogo) do banheiro e este que escreve estas palavras sem ordem, precisava, também, aliviar a vontade de aliviar-se, pois é muito novo para contar com problemas nefrológicos. Pois bem: eu desci, ela viria depois. <br />
<br />
Poucos minutos depois, ainda desnorteado pela afinidade surpreendente, procurei por ela através da multidão de cabeças e corpos espremidos no recinto que transbordava gente pelo ladrão. Tinha ela indo embora? Não. Ainda não.<br />
<br />
Foi quando ela surgiu na minha frente, me buscou pela mão, a mesma do copo, a mesma que lhe segurou a cintura na hora da dança, a mesma que protegia a boca na hora de confiar-lhe um galanteio, e me arrastou para o canto escuro e invisível. Recostou-se na parede. Fitamo-nos de olhos fechados. E foram lábios e línguas e respirações e sorrisos. Os movimentos repetiram-se por mais alguns instantes. E ela desapareceu como veio: despretensiosamente encantadora.Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-60694845998436633092011-11-20T17:00:00.004-08:002011-11-24T07:42:39.185-08:00Domingo<div class="MsoNormal">Não escrevo há alguns dias, mas não deixei de pensar em escrever. Quase uma cobrança diária, mas não chegava a me incomodar. Quer dizer, não chegava a me incomodar tanto. Simplesmente não estava com paciência ou inspiração para colocar os pensamentos em palavras. Muitas coisas aconteceram neste intervalo, talvez, então, esperei a massa secar. Permiti que o tempo se encarregasse da minha ausência literária - também não tenho lido. Primo Bazilio deve estar meio puto comigo, não lhe faço uma visita há semanas. Mas tudo bem, vida que segue. Vida. Adoro essa palavra. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">É estranho preencher espaços abertos pela solidão. Estar só nem tanto. Um almoço com a melhor amiga, moqueca de peixe, camarão e siri (este último só entrou na panela por pura insistência dela, admito que soube convencer o garçom a convencer a cozinheira com maestria e simpatia) e passamos a tarde aqui em casa. Rimos, conversamos, assistimos a um jogo de futebol, depois a um filme. E quando ela desceu para tomar o táxi, a porta fechada abriu ferida antiga: o silêncio das decisões. É quando revemos o que fizemos, o que deixamos de fazer, o que deveríamos ter feito antes. No amor, no trabalho e na vida. Aquela palavra que gosto tanto. Será que estou no caminho certo? Se minha ex gosta de outro, que bom, ela seguiu adiante. Se a mulher que estou saindo me deu um pé, que lástima, levarei tantos outros. E é como aquele poema do Cacaso: “Perder um amor é muito duro/ Perder dois, bem menos.” Se o pessoal do trabalho me ligou perguntando quando volto, que ótimo, disse que voltaria só daqui a alguns meses. Se minha vida tem algum sentido até aqui, que merda, não consigo ter certeza, mas posso escrever. E é a única coisa que sei que gosto de fazer. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Deixar de escrever é meu maior silêncio. Palavras desesperadas se estapeiam aqui dentro e não há tocaia que me faça mais cair nessa armadilha solitária. Ausentar-me de mim. Como é bom ouvir o som das palavras surgindo à minha frente, o barulho distante dos carros passando pela rua, sentir o gosto amargo de uma noite de domingo. Acho que a vida é meio domingo: uma dádiva que não sabemos apreciar, mas quando teimamos em aceitá-la, somos felizes. Na medida exata de sua existência efêmera e, por isso, deliciosamente paradoxal. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal"><br />
</div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-85353282684070125382011-11-18T06:42:00.001-08:002011-11-18T06:45:13.204-08:00Quem quer fumo, vai à boca- Cana de otário é vadiagem.<br />
<div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">A segurança, o desafio nas palavras, vem na voz cantada de Luís Carlos de Souza, 25 anos, um mulato franzino conhecido pelo apelido de Pimenta, morador atualmente do “Inferno Colorido”, um conjunto habitacional no bairro de Realengo, e freqüentador da maior boca de fumo do Rio, a do morro da Providência, atrás da Central do Brasil. O movimento na área dos traficantes “Tainha” e “Cueca”, que estão na cadeia mas conseguem ainda dar ordens no morro, é grande, organizado e vigiado, dia e noite há quase dez anos. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">O caminho que leva à boca todo mundo sabe, inclusive a polícia. A escadaria que dá na Ladeira do Barroso, no alto do morro, entre a Gamboa e o bairro de Santo Cristo, começa em frente à 2ª Delegacia Policial, na Rua Bento Ribeiro. À medida em que se vai subindo os degraus irregulares, nota-se pelos lados, atrás dos barracos, homens com atitudes suspeitas. No rosto, a marca da desconfiança transmitindo medo a qualquer estranho. Nas janelas ou estendendo roupas no varal, os olhares interrogativos das mulheres. Ali ninguém confia em ninguém. Quando uma lei no morro não é respeitada, “dança” até quem não tem culpa. Todo cuidado é pouco. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">- Tá limpeza, irmão. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">O sinal verde do homem de boné, jaqueta Lee, apesar do calor, é confirmado por outros três colocados estrategicamente perto das escadas. O desconhecido está sozinho. Lá embaixo, a delegacia e os carros desaparecendo dentro do túnel João Ricardo. Luís Carlos, de camisa aberta no peito onde desponta uma guia vermelha e preta de Exú, aperta um “fininho”, sentado num degrau com a marmita do lado. O relógio da Central do Brasil marca 18h45 e ele acabou de chegar de uma obra na Praia do Flamengo. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">- Para aturar a batalha, só fazendo a cabeça. Se a gente dá duro, os “zome” cisma. Se a gente fica no desvio, nem se fala. Mas nessa transa de bagulho, eles gostam é de pegar os pleibóis que vêm vacilar aqui em cima. A patrulhinha só fica esperando lá embaixo. N a descida, tem que deixar uma nota. Eles têm sempre um troco para não ver o sol quadrado, não é mesmo? Com a gente, se não levar na conversa, o coro come e ninguém vê. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Pelos lados, homens, rapazes e mulheres conversam alto, contando vantagens. O revólver de cabo de madrepérola aparece na cintura do mais afoito, com toda pinta de guardião da boca. O fuminho vai correndo solto de boca em boca, sem pressa. Se demorar, neguinho chia. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">- Solta a franga. Ô da política, tá com chiclete no dedo?</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Um pouco destacado está um rapaz de calça jeans, camiseta e óculos escuros. Acabou de descer de um Volks vermelho, no Largo do Barroso. Subiu uns lances de escada e logo – logo fez um canudo com uma nota de Cr$ 10,00, com que aspira um papelote de cocaína, que custa Cr$ 150,00 e arriscado a vir, todo malhado, muito talco, sal e açúcar. É vendido quase exclusivamente a “estrangeiro” e tem o sugestivo nome de “Brizola”. O cartucho de maconha custa 60 cruzeiros e geralmente é vendido pelo dobro no asfalto. No Baixo Leblon, qualquer baseado vale um “galo” (50 cruzeiros). </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">As crianças não avisam, mas quando a polícia chega no morro é o medo delas que dá o alerta. Brincam pelas escadas implorando sempre ao estranho um trocado, um refrigerante ou mesmo um pão. As maiorzinhas participam da transação, vendendo fumo. Ganham 10% por cada cartucho vendido, uma maneira do dono do peso escapar do flagrante. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Pimenta está de cabeça feita e as palavras são fortes e agressivas:</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">- Tô numa batalha lá no Flamengo, de servente de obra. Dá pra tirar um trocado, que vai tudo na passagem. Às vezes, fico injuriado e faço uns ganhos. Sei que não vale a pena, mas meu filho ficar sem leite e comida é duro. Como vou provar aos homens que estou trabalhando se minha carteira não está assinada? Tem que ficar sempre atento para dar o pinote.</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Sentado nas escadas tranquilamente, de barba rala, chapéu enterrado na cabeça, o homem da boca vai contando o dinheiro e só passam entre os dedos notas de Cr$ 50,00, Cr$ 100,00 e Cr$ 500,00. Ao lado dele, uma sacola onde está guardada a erva. O movimento continua, com gente chegando a pé pelas escadas ou de carro pela Ladeira do Faria, na Gamboa. </div><div class="MsoNormal"></div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">O movimento da boca cresce, como também a atenção dos homens que vigiam as entradas principais. Antes de ir embora, em direção à Central, onde vai pegar o direto para Realengo, Luís Carlos se despede:</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">- Vou dar linha à pipa que o vento tá a favor. Sou mesmo é empregado da vida. Ela, às vezes, maltrata, machuca a gente, mas a dor é só minha. E ninguém tem nada com isso. Quem trata de mim sou eu. Olha aí, vou sartá. Até mais. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">(Tim Lopes – REPORTER – Nº17 – MAIO DE 1979 – PÁGINA 7)</div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-47718241874231673962011-10-12T07:01:00.002-07:002011-10-12T07:06:46.217-07:00Vovó Guiomar<div class="MsoNormal">Vovó Guiomar faria hoje cem anos de idade. Libriana dos pés ao fio de cabelo. Uma doçura de pessoa. Terna, paciente e muito sensata. Não havia parado para pensar na data centenária, sua filha, minha mãe, que me lembrou anteontem: sua avó completaria um século de vida nesta quarta-feira. Sorri com a boca entreaberta, busquei sua imagem no ar pela memória e consegui vê-la sentada no canto do sofá, lado direito, seu lugar cativo do apartamento da Joaquim Nabuco. A casa da Santa Clara, que não pude conhecer, se desenha sempre diferente na minha imaginação. Pois fiquemos pelo apartamento, quarto andar do prédio, de frente para rua, onde me sabia cada vez mais velho à medida que meus olhos iam ultrapassando os limites do parapeito. “Não debruça, menino!”. Hoje alcanço a saudade olhando pela mesma janela. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Os almoços de domingo e os Natais eram sempre lá. Família reunida somente no fim do ano – isso quando calhava de conciliar os compromissos de todos. Era povo de Brasília, São Paulo, Porto Alegre, daqui. Primos que iam se multiplicando, outros que se ausentavam para outras ceias – havia mais famílias além da nossa. E vovó assistia a tudo, àquela bagunça, sempre sorrindo serena, sentadinha à direita do sofá, ou à direita da cabeceira da mesa de jantar, lugar que era meu até o tio Sérgio chegar. Aquele lugar era dele, mas me emprestava enquanto estivesse na Granja Viana, em Cotia. Ric vinha sempre ao Rio comprar camisas da Company (não vendiam em Sampa). Carol e Eliane, suas irmãs, corriam para Bumbum atrás dos biquínis cariocas pelo mesmo motivo. Tia Lia tirava as tardes para levar os três pirralhos nessas lojas. Tio Sérgio contava histórias na mesa e comia um prato de feijão cheio de pimenta malagueta, inclusive mordendo uma inteira sem pestanejar. E me fitava como se dissesse em pensamento: tem coragem, garotão? E me arremessava para o alto. E eu nem era mais tão novo, deveria ter uns seis, sete anos. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Tio Paulo se dividia entre a praia do posto 8 (em frente à Laura Alvim, em frente à Laura Alvim, com a convicção fanática dos geminianos) e o BarraShopping. Era pra levar a Paulinha nos brinquedos e no Mc’Donalds. Eu, claro, ia junto. Tia Selma ia também e comprava presentes para todos. Todos. Mônica e Daniela já eram moças, adolescentes, já saíam sozinhas. Quando vinham, uma ficava pendurada no telefone com algum namorado. A outra tinha mais um pouco de paciência conosco. Achava as duas lindíssimas, com aqueles olhos verdes e sorrisos enormes e brilhantes. Eram as primas mais velhas. Eram mulheres. O Gilson chegava sempre tarde em casa, acordava meio-dia, era da night mesmo. Tio querido. A primeira coisa que gostei nele foi a gargalhada altíssima. A segunda era que me dava uma grana “para comprar um guaraná”. Sendo que com aquele dinheiro eu compraria quase uma fábrica inteira. E o Gilson era quem distribuía os presentes no Natal. Vovó Guiomar presenciava tudo aquilo na maior paz e tia Celina, sua irmã, figura única no mundo, estava sempre aflita com a comida, com os horários, com os choros, com a sobremesa, com o Banco do Brasil e com o Banerj. Mas adorava a casa cheia de sobrinhos-netos, de sobrinhos e sempre nos levava para ver fotos antigas coladas nos armários de seu quarto – que nos emprestava nas festas de fim de ano. Tia Celina, ou Tati ou Tai (apelido exclusivo deste que vos escreve) era uma segunda avó para nós. Ela e vovó eram a nossa casa.</div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Vovó Guiomar cozinhava muito bem. Lembro do livro de receitas que ficava na cozinha. Da geladeira que dava choque. Do filtro azul. E do doce de batata roxa, das fatias lulu, dos quadradinhos, do bolo de nozes, do pudim de clara, da gelatina de camadas, do pudim de ameixa (que eu comia tudo, menos a ameixa), da carne assada, da maionese de batatas e cenoura, da sopa de legume como entrada, do sininho para chamar a empregada, do descanso dos talheres, da toalha de mesa de borboletas. Do sorvete de creme derretido quase um creme mesmo, da lasanha da Veronese quando não se queria cozinhar, de fechar a janela por causa do frio que só a vovó sentia; das orações de mãos dadas, dos choros contidos. Gostava de sentar ao lado dela, da minha, da nossa avó, no sofá e ficar agarrado à sua mão e contando coisas do colégio. Eliane, quando vinha de São Paulo, também gostava deste mimo. Às vezes vovó tirava as sandálias e punha os pés para cima para melhorar a circulação. Era sempre na hora da novela das oito. No especial do Roberto Carlos a família toda parava em frente à televisão (que custou a ter controle remoto). E o presépio na entrada da sala de estar era sempre um sinal de que vovó e tia Celina se preparavam para nos receber. Até hoje é assim dentro da gente. </div><div class="MsoNormal"><br />
Quando eu morava ainda na Canning, vovó sempre me visitava à tarde. Levava uma pastilha Garoto e me fazia companhia até minha mãe voltar da galeria de artes ou meu pai sair do plantão. Sorriso lindo, sereno, voz mansa. Vovó era uma dama. Uma pessoa boa, carinhosa, mas não era ingênua, não. Era feliz. Apesar da perda de uma das filhas ainda muito nova, apesar de ter se casado - e separado – apenas uma vez. Uma mulher que tinha o brilho e a inocência de uma criança e, ao mesmo tempo, a alegria e a ternura. E foi a grande matriarca da família, seguindo a linha de sua mãe, Alzira, uma baiana braba. Diferentes, mas semelhantes na arte de proteger a família. Talvez por isso tenha nascido no dia doze de outubro, onde se comemora o dia das crianças e o dia da padroeira do nosso povo. </div><div class="MsoNormal"><br />
</div><div class="MsoNormal">Vovó Guiomar, feliz dia das crianças. Que saudade de você...</div><div class="MsoNormal"><br />
</div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-45436148905420161322011-09-22T11:07:00.001-07:002011-09-22T11:10:43.536-07:00ClichêsAs palavras a seguir não serão escritas por mim. Elas já estavam por aqui, considero-me apenas um arauto desses novos tempos. Como se me apalpassem o espírito, como se me cortassem a carne. Surjo, pois, de onde menos poderia esperar e me flagro sorrindo ao lembrar da frase: o telefone só toca quando estamos distraídos.<br />
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Escolhi as coisas simples. Não é fácil, portanto, contentar-se com todas decisões que tomamos durante a vida. Procuramos esconderijos em nós mesmos, buscamos fugir do que não podemos escapar, oscilando sempre no intervalo do que queremos ser e do que poderíamos ter sido. E me conforto ao recordar do que me disse um amigo tempos atrás: para se ter uma coisa na vida, é preciso abrir mão de outra.<br />
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Como no samba do mestre Luiz Carlos da Vila: “E nesse vai-ou-não-vai/ Fiquei meio sem direção/ Cometa que passou bem longe/ Dos olhos da multidão”. A velocidade que nos impomos para o reconhecimento de nós mesmos, como se nos cobrássemos desfechos sem meios, como se a avidez pelo resultado superasse o medo da derrota. Vencer é enfrentar desafios de frente, que se danem os clichês – sei que muitos porão dedos sobre tais frases ou pensamentos – mas o escritor que tem medo do lugar comum não vai a lugar algum. Como disse certa vez o roteirista francês Jean-Claude Carriére: “Não tenha medo de partir do clichê, de uma situação conhecida. É trabalhando que se chegará à originalidade, pouco a pouco. Ao procurar a qualquer preço uma situação inicial absolutamente original, e por isso desconhecida, terrível, pouco a pouco ela será rejeitada, atenuada, arredondada, terminando de forma medíocre no convencional”. O que percebo ao examinar minha existência, é que sempre quis fazer diferente, ser original, mas não deixando de ser eu mesmo, como se prega por ai até hoje. Falhei. Zerei-me. E descobri que todos partimos do mesmo ponto, somos clichês de nós mesmos, ainda bem. A procura pelo que queremos vem depois de aceitarmos que o segundo fôlego é o que nos move.<br />
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E não haveria como não lembrar o que me disse uma grande capoeirista, do alto de seus vinte e um anos: devagar também é pressa.<br />
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Por muito tempo fui mistura do que quiseram que eu fosse e do que me permiti que me forjassem. Afoguei-me muitas vezes, mantive a calma e a bebedeira, procurei viver momentos mágicos, incríveis, surreais, sensacionais e fantásticos. Palavras bonitas, mas que perdem a força por (não) representarem a mesma coisa. Significados diferentes que querem adjetivar momentos ou épocas inesquecíveis. Taí uma palavra-clichê que, de longe, supera todas aquelas outras: inesquecível.<br />
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E recorri à frase lida pela manhã em algum lugar: quem olha pra fora sonha, quem olha pra dentro acorda.<br />
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Mas quem recomeça todo dia não recomeça nunca.Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-91137922109295714162011-08-18T11:55:00.018-07:002011-08-18T17:04:44.913-07:00Polônio e Laertes<div style="margin-bottom: 0.0001pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm;">Gostava de pensar que as coisas deveriam ser simples. A luz do sol, o farfalhar das árvores,<span class="apple-converted-space"> </span>o azul de tantos céus diferentes. A caminhada pela manhã, a saudação ao vizinho da rua, o olhar atento às crianças, outro mais atento às moças, o andar trôpego dos perfumados pela<span class="apple-converted-space"> </span>aguardente. Recolher-se cedo, aproveitar a casa, a sala de leitura, visitar a mãe. E não havia lugar para notas, havia? Tantas similitudes entre o que tinha planejado para sua vida – e o que ela lhe haveria de arranjar. Eis aí o que necessitava, viver plenamente com menos recursos. Viver, apenas. E isso já lhe bastava. Já lhe confortava a idéia de que, ao despir-se das vidas que lhe impuseram outros, seria um homem novo: ele mesmo.</div><div style="margin-bottom: 0.0001pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm;"><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Não havia lá tanta graça em desocupar-se de uma profissão. Mas de um trabalho qualquer, eis<span class="apple-converted-space"> </span>aí onde reside a dignidade do homem, não se pode abrir mão. E como proveria seu sustento, já<span class="apple-converted-space"> </span>que a féria mensal lhe seria reduzida? Estalou os beiços e murmurou para si: a minha fome não<span class="apple-converted-space"> </span>se resolve com notas, ora, que mal há nisso? Ainda tenho saúde, alguma idéia na cabeça e a língua: tenho a palavra.<o:p></o:p></span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Prendeu o ar e atirou-se contra o tempo. Tudo era lento e embaçado. Foi à casa da avó, mais à frente visitou o antigo colégio, para lá não havia mais recreios – tinha sido erguido um prédio que lhe havia escapado do mapa da memória. Riu-se. Seguiu viagem no pensamento e foi repreendido por si mesmo pela insistência em trazer ao presente tantos passados de sua vida. <o:p></o:p></span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span style="font-family: inherit;">Ergueu-se de mais um devaneio e foi buscar um copo d água na cozinha. A louça estava lavada, mas tanto a alma quanto a consciência não reluziam o mesmo brilho. Por isso fez do prato espelho e procurou-se sem resultado. Lembrou do que havia dito a si: a minha fome não se resolve com notas. E sorveu um longo gole d´água pelo gargalo da garrafa, porque os copos estavam também limpos. Quem era ele para mudar o rumo das coisas? Tudo em seu devido lugar nos dá a falsa impressão de ordem, de asseio, mas são truques. Mas é apenas uma sensação – concluiria.<o:p></o:p></span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Ao peito aberto, caros, lhe coube outras aflições. A cartomante disse que deveria seguir sua intuição, as coisas estavam prestes a acontecer. Aos amores, às notas que não lhe fazem falta, às circunstâncias que lhe cercam: prossiga firme.<o:p></o:p></span></div><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><u1:p></u1:p> </span><br />
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm;"><span style="font-family: inherit;">E tomou a reta sem ler a bula.</span><span style="font-size: 13.5pt;"><o:p></o:p></span></div><u1:p></u1:p></div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-67309880647760286462011-07-11T18:50:00.004-07:002011-07-11T18:56:30.850-07:00Regra três<h4 style="margin-bottom: 0.0001pt; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm;"><span style="font-weight: normal;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i>"Abandonou-te?<br />
- Pior ainda! Esqueceu-me."</i></span></span></h4><div><span style="font-weight: normal;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i>(Mário Quintana)</i></span></span></div><div><span style="font-weight: normal;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit; font-size: x-small;"><i><br />
</i></span></span></div><div><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"></span><br />
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">O perfume do pão torrado ainda estava na lembrança quando deu-se a discussão. À mesa, pratos, copos e cotovelos. Não havia encosto suficiente nas cadeiras. Caíram sentados imóveis <st1:personname productid="em silêncio. Talvez" w:st="on">em silêncio. Talvez</st1:personname> o maior intervalo entre suas vidas a partir daquele instante. As janelas escancaradas e o ar pesado. Era uma vez uma vez que não era.<o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Não havia mais barulho antes da risada. A cozinha ficou distante de tudo, até mesmo daqueles tempos à beira do fogão nas tardes de sábado. Ela vociferava e o repreendia enquanto ele relembrava quantas vezes já havia sentado naquele chão, próximo à área de serviço, descruzando e cruzando as pernas, mas prestando atenção no refogado. Prestando atenção nela.<o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Mesmo com os avisos, ele esquecia o copo molhado em cima da mesa de madeira. Ela reclamava da mancha que se formaria ali. Ele pedia desculpas, ela ria com o barulhinho conhecido que seu riso faz. Mas a vida é meio como o mar, com marés, ventos e tempestades. Pode ser traiçoeira e periga não se sair de onde está. A calmaria burla o pescador.<o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">O filminho passou na cabeça. Aquele samba, aquela vez, aquele carnaval, aquele momento em que não viu mais sua vida sem ela. Aquela hora em que ela não se viu mais sem ele. Quando se perderam num tempo desconhecido e se encontraram nas primeiras pessoas do singular. E do plural. Erros de concordância de um futuro que passou.<o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">A criança cresceu linda. Forte e cheia de vitalidade. Não precisava mais consultar pai e mãe, eles ficaram para sempre naquele apartamento. A infância passou invisível. A campainha que não funcionava era um sinal. Silêncio. Sem alarde. Não acorde. Não incomode. Ele teve que ir embora. Ela ficou. Porque amar é como dar à luz ao coração.<o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;">Não houve mais palavras. Tampouco silêncio. Ocorre que o barulho daquela risada busca nele um pouco dele que partiu. E é como diz aquela do Chico: saudade é o revés de um parto, a saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu.</div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Ou que nos esqueceu.<o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div></div><div><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0px; margin-left: 0px; margin-right: 0px; margin-top: 0px;"><br />
</div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-78676100759417805162011-06-02T09:46:00.000-07:002011-06-02T09:46:18.800-07:00Memória<span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Tem um filme novo passando: "Eu sou o senhor do castelo". Tá afim? Lá no Roxy. Depois a gente vai na Colombo, aí você come aquele uêiful empanturrado de manteiga e encharcado de mel. Bom, se tiver isso não tem sorvete de pistache, né? Tem?! Cacete, tá certo. Olha só, deixa eu te falar uma coisa, assim, pra você saber, esse lance de cinema, exposição, falar inglês e tudo mais, isso é mais com sua mãe, né?, você sabe. A parada do teu pai é rua, é o jogo do Vasco no Maraca, São Januário, tá lembrado?, quando a gente chegou cedinho ali na Praça da Bandeira, almoçou ali perto - pra ver a torcida chegando, o pai com os filhos, o casal vascaíno, os que vão sem camisa, mas levam pendurada no ombro. Foi daquela mesma vez que teve um assalto, lembra?, no ônibus e você ficou todo assustado... É, eu sei, ali qualquer um teria medo, eu também, porque ver gente armada é foda, não se sabe qual é a do cara, o que ele quer - ou o que querem dele. Mas voltando ao cinema, quero dizer, me falaram desse filme, queria ir contigo, parece ser legal. Vamos mesmo, fechado? Maravilha, passo aí na tua mãe lá pelas quatro horas, agora são onze da manhã, acabei de chegar do calçadão. Poxa, não vai dar, tô de folga esse fim de semana. Gostou do bandejão, né? Melhor que o do colégio?! Pô, aí, tua escola tá mal servida, hein?! Ih, não vai sair dizendo isso que eu disse, hein? Isso é papo de homem. Tá legal. Amanhã tem Vascão, hein? Mas não é aqui, é lá, entendeu? Aí passa na televisão. Isso, Bebeto. E parece que esse ano a gente é bicampeão brasileiro! Ano passado o Cocada quase acabou comigo. Mas acabou foi com eles. Deixa eu ir lá, meu filho. Daqui a pouco tô aí. Um beijo.</span><br />
<span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
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<span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Até já.</span>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-24330583802459257682011-05-09T19:48:00.003-07:002011-05-09T19:50:19.676-07:00Silêncio<div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Frear o tempo com os olhos<o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Ouço chover. Não é preciso abrir as cortinas. As vidraças tremem suavemente, o som da água me protege do frio. Um banho de palavras sem luz. O desejo desenfreado para que chova a noite inteira. Ainda que fosse senhor de mim, não saberia esconder as lágrimas. As janelas desatam a tagarelar. Examino a sala e não reconheço alguns quadros, talvez eles também não me saibam. O sopro gelado da cozinha. A almofada esquecida no chão, o espelho torto na parede do banheiro. Foi quando me lembrei que palavras são estrelas sem brilho. <o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Tatear o ar com as mãos <o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Ainda que fosse escravo de mim, não saberia esconder as feridas. É que tenho tido dificuldade <st1:personname productid="em escrever. Como" w:st="on">em escrever. Como</st1:personname> se as palavras estivessem escondidas na luz. Não fosse apenas não enxergá-las, mas não há como senti-las. Sinto-me suspenso, como se sob efeito de reticências. Também não adianta me desviar dos estalos da consciência, supostos atalhos para onde não tenho me encontrado. E de nada adianta insistir que palavras são fósforos. <o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Riscar o céu com os pés <o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">De pernas para o ar me deixaram elas, as estrelas sem luz que são fósforos. Para este incêndio sem alarmes, a rota de fuga é buscar metáforas sem sentido. Talvez sirva como consolo literário, essa coisa de encurralar a inspiração, atormentá-la madrugada a dentro com respingos de insônia, da chuva que não terminará enquanto ainda houver fôlego. A luz que me deixa as palavras cegas, o reflexo de estrelas sem brilho, de fósforos riscados. A escuridão me permite fabricar tantos de mim que escrevo com os pés suspensos e mãos idem. Mas de olhos fechados. <o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;">Porque silêncio é uma palavra invisível. <o:p></o:p></span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><span class="Apple-style-span" style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="MsoNormal"><br />
</div>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-64395400792068413172011-04-13T08:57:00.004-07:002011-04-13T09:10:37.120-07:00O luto de Tasso da Silveira<i>"A violência é tão fascinante</i><br />
<i>E nossas vidas são tão normais</i><br />
<i>E você passa de noite e sempre vê</i><br />
<i>Apartamentos acesos</i><br />
<i>Tudo parece ser tão real</i><br />
<i>Mas você viu esse filme também.</i><br />
<i>Andando nas ruas"</i><br />
<i><br />
</i><br />
<i>Legião Urbana - (Baader-Meinhof Blues)</i><br />
<br />
--<br />
<br />
<br />
A minha mãe foi aluna do Tasso da Silveira. Soube disso quando assistíamos pela televisão às reportagens sobre o ataque. Enquanto suspirava triste e murmurava alguma coisa para si, eu prestava atenção à sua reação. Mas sem tirar os olhos da tela. Então virei o pescoço para sua direção, inclinei o queixo para o lado onde ela estava sentada, numa tentativa de captar melhor seu luto, enquanto as imagens de pais desesperados e crianças manchadas de sangue invadiam a sala. Imaginei como seria estar na redação naquela hora. Tentei imaginar que, caso estivesse na redação, como seria estar de férias e não participar da cobertura. Nesse caso, não era de se imaginar, porque, de fato, era o que se sucedia. Não cheguei a lamentar não estar lá para cobrir o caso, mas acho que minha profissão tem o dever de informar sob qualquer circustância. Informar, pois bem. Mas acontece que iria viajar neste mesmíssimo dia para o Nordeste. Também não cheguei a lamentar a viagem - num dia marcado pelas violências social e psicológica às quais somos submetidos diariamente. É como cada nova informação fosse uma peça nova para vivermos, à pele de cada personagem da tragédia, mais uma etapa do sofrimento das famílias, amigos e professores. Não bastasse nos identificarmos prontamente com os alunos mortos a tiros - porque todos nós fomos crianças e todos as temos em nossas famílias - cada lágrima e cada silêncio ficou um pouco nosso também. Mas, ao mesmo tempo, todo o ódio e frieza passou pela minha cabeça. Acho que muita gente tentou entender o que se passava na mente daquele rapaz, o que passou na hora, o que se passou anos antes, momentos antes: e o que não passou.<br />
<br />
Na manhã daquela quinta-feira, fui mãe e pai daquelas crianças. Fui morto mais de dez vezes. E ainda estou ferido (como aquela manchete precisa do Diário de Pernambuco). Mas também fui assassino. Fui policial. Fui professor. Fui amigo. Fui colega. Mas ninguém foi Tasso da Silveira. O poeta passou despercebido naquela matança covarde. Lembro que escreveram um verso dele em algum lugar, mas as atenções eram quase todas voltadas ao assassino, com certo excesso, a meu ver, e algumas às vítimas e seus familiares, drama explorado também com certo exagero, na minha opinião. É claro que havia motivos mais do que justos para que o escritor ficasse invisível naquele momento, mas o que me chamou atenção foi, depois do primeiro impacto sobre as mortes em série, minha mãe olhando para cima, com as mãos elevadas e espalmadas próximo ao rosto, falando baixinho: ai, Tasso, professor querido, que tristeza que se passou diante dos seus olhos. Ele, que, ao final da vida, já estava quase cego, testemunhou um massacre contra nossas crianças. Ele, que ministrava aulas de Literatura e tinha a poesia como imagem infinita.<br />
<br />
Tasso da Silveira, explicava minha mãe, veio do Paraná para dar aulas no Rio nos anos 60. Foi professor de Literatura na Faculdade Santa Úrsula, onde deu aula para sua turma durante três anos. Quase cego, era conduzido pela esposa até as salas da universidade. Adotou o costume de recitar versos entre uma lição e outra, tudo sem ler uma linha sequer. Só de memória, além de recitá-los, dava apelidos aos alunos. O da minha mãe era "Suavíssima", porque, dizia, que sua voz era como um murmúrio de um rio.<br />
<br />
Quando sua mulher morreu, Tasso, de alguma forma, ficou órfão, pois ela era além de seus olhos, sua luz. Era ela quem o o ajudava na correção das provas.<br />
<br />
Minha mãe não esquece o primeiro dia de aula após o luto. Ele chegou, atirou a pasta em cima da mesa (como se fosse um murro seco), em seguida fitou a turma (provavelmente tudo embaçado), e disse uma frase que nunca esqueceria: "Estou chegando do pedaço mais profundo de minh´alma, perdi parte de minha vida".<br />
<br />
Mas nunca deixou de dar aulas. Sozinho, pegava o lotação, saltava na Praia de Botafogo, e aguardava que alguma aluna o conduzisse pelo braço para atravessar as duas pistas, perigosíssimas, de Botafogo. Minha mãe conta que teve a honra de conduzí-lo várias vezes naquele trajeto. Então, nesses momentos, para não constrangê-lo, ela dizia: "Professor, o senhor me dá a honra de eu poder acompanhá-lo?"<br />
<br />
Ele lhe dava o braço e seguiam pela Rua Farani até faculdade.<br />
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<i><br />
</i><br />
<i>"Verso meu, fio d'agua oriundo</i><br />
<i>Da fonte da dor... pudesse</i><br />
<i>(Ai de mim ! )</i><br />
<i>Fazer-te tão claro assim,</i><br />
<i>Que se visse, lá no fundo,</i><br />
<i>- só - minha alma cantando</i><br />
<i>ou soluçando."</i><br />
<i> (Tasso da Silveira)</i>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-73590970667596850012011-03-24T07:12:00.005-07:002011-03-24T07:19:23.131-07:00Ensaios de Carnaval - 2ª parteJá não era a primeira vez que estranhava a fantasia. Da cama, fitava a peruca, boné, colares floridos e dourados - pendurados no cabideiro. Vasculhava com os olhos o chão do apartamento, e lhe ocorreu rapidamente que o assoalho não era asfalto. O cinzeiro dos cigarros que não fuma. O dia ainda não havia surgido na janela e já era possível buscar na memória algum refrão de alguma marchinha. Como se a melodia pudesse lhe transportar para cozinha, pois as garrafas lhe esperavam na pia. Algumas já vazias. E ele também.<br />
<br />
Já não via tanta graça, às seis da manhã, em sentir o gosto misturado na boca de pasta de dente, café, pão com manteiga e vodka. Era estranho fabricar paladares para perder o tato. As panelas sujas sob o fogão, talheres amontoados no canto da pia, pratos empilhados no outro. Era preciso ainda um banho para despertar, para curar os excessos da véspera, era aí que entravam em cena os olfatos, o cheiro da camisa empapada de suor e perfume e nicotina e alcatrão, os jornais dobrados sobre o bidê, o vidro de shampoo próximo ao ralo, cabeça fria, água quente, respirações fabricadas por reflexões: cabeça quente, água fria. Ensaboar-se era até filosofia, porque percorria itinerários diferentes frequentemnte, mas sempre começando pelas axilas. De preferência, primeiro a esquerda. E ombros, barriga e peito. Havia vezes que invertia, deixando-a por último como castigo por estar mais rechonchudo. De qualquer maneira, era nessa primeira etapa do banho que refletia mais. Partes íntimas, pernas e pés, além das orelhas e rosto, não importava muito a ordem da lavagem, ficavam para a segunda etapa. Nesta manhã de Carnaval, ao contrário do que norlmalmente acontecia, o banho foi rápido - talvez não tivesse muito mais o que pensar, porque já sentia.<br />
<br />
<br />
Vestiu a fantasia. Mas o que pareceu é que a fantasia havia se vestido dele. O que se viu foi um folião cansado de si, de dentro de si, mas financiado pelo estado etílico ao qual havia se proporcionado. Pôde caminhar pelas ruas atrás dos refrões. Sempre os mesmos. Um carnaval que, ao fantasiar-se, se camufla - se esconde. A euforia da euforia do lado de fora da gente. Um banho que não refresca. Já não tinha dinheiro para a cerveja, a vodka havia terminado alguns goles atrás. Anoitecia e as pessoas não paravam de chegar. Bueiros entupidos de gente, o som abafado de centenas de vozes conversando perto dali, o asfalto molhado e quente de cervejas antes e depois de bebê-las, a cidade cercada de ruas interditadas e carros esfomeados, lhe dando a entender que os blocos são ilhas cercadas de tempo e espaço, como se nada fosse maior do que o continente. De repente tudo ficou apertado e barulhento, menos para todos que haviam naufragado naquele arquipélago de verão, como ele havia pensado ser um porto. Mas deu-se conta que agora os ventos são outros. Direções novas, portanto.<br />
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Fantasias não lhe cabiam mais.Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-38613991206047757782011-03-11T06:37:00.000-08:002011-03-11T06:37:43.560-08:00Ensaios de Carnaval - 1ª parteOs ponteiros do relógio comprado tinham a precisão da necessidade da compra. Não tinha valor material algum, mas contaria histórias além do tempo. O vendedor ainda fez graça, ao elogiar minha duvidável destreza com a pulseira cheia de nove horas. Vira pra cá, mexe pra lá, aperta aqui, seu pulso não é tão... pois é, peraí. Alguns segundos depois oferta e procura acertaram-se. <br />
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Os apetrechos foram aos poucos encontrando lugar no corpo. Anéis, cordões e pulseiras douradas mal e porcamente por artesãos de ocasião. A julgar pela inconsistência do preço - e do mercado -, parecer-se com o personagem criado às vésperas dos festejos, até que foi bom negócio. Caminhar pelas vielas do centro da cidade, equilibrar-se nas fendas entre os paralelepípedos, inclinar a cabeça para um lado e o corpo para outro, como se o coração também procurasse a mesma fantasia. Pequenas tendas com roupas enormes, biroscas entupidas de gente esfomeada. O Carnaval chegaria. E a fantasia é de quem vê - e não de quem veste.<br />
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O silêncio induzido de uma sexta-feira corpulenta, como se lhe tivessem prendido a respiração. Perucas ambulantes, vozes percorrendo em ziguezague os corredores do comércio. Agentes da lei de prontidão, caso houvesse confusão. Ao fundo da cena era possível encontrar, se fechássemos bem os olhos, se encolhêssemos ligeiramente os ombros, se abaixássemos suavemente o pescoço, a melodia da marchinha antiga, aquela que não lembramos de onde sabemos, mas sabemos - por isso lembramos. Um sorriso nos surpreende lento. No meu caso, suspendeu as lentes míopes e astigmáticas que protegiam o rosto amassado de sono. O bocejo interrompido pelos dentes.<br />
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E é bom quando isso acontece.Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2677384391553177547.post-79177590269259892262011-03-10T05:23:00.000-08:002011-03-10T05:23:17.356-08:00* Lutas- Não tinha pensado nisso...<br />
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- Mas não é o que queria?<br />
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- Eu falo muito e, às vezes, acredito no que digo, e então olho pra mim e nem sem mais o que é verdade. Tive essa ideia maluca de lutar... O que estou querendo? Quero mesmo estar lá firme e forte e tal? Ou, como diz meu filho, é só meu ego? Ou estou tentando substituir a velha dor por uma nova? Eu não sei! Eu não sei...<br />
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- Veja bem, sei que geralmente não falo muito. Estou sempre ouvindo e observando... Mas quem você é, a sua parte, está tão cheia de vida... Todos temos esse fogo, mas sem chance de usá-lo. Então, ele se vai. Mas você pode. Tem essa chance, então faça. Por que não? É quem você é. É quem você sempre será. E não mude de ideia por ninguém, até que você esteja pronto. Não importa o que possam pensar. Só importa o que você pensa. Olhe pra mim. A decisão é sua. E se é algo que quer fazer e se é algo que tem que fazer, então faça. Lutadores lutam.<br />
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- Lutadores lutam, né?<br />
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<span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">*<i> Diálogo do filme "Rocky Balboa"</i></span>Bruno Quintellahttp://www.blogger.com/profile/09015263073260616550noreply@blogger.com1